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(inaugurada em 04/03/1974)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

    Palavra de honra: jamais imaginei que o carioca gostasse tanto assim de ponte. Depois dela, tudo o mais perdeu o significado. se pensa na ponte, se fala na ponte, se passa na ponte. E surpreende até que o carioca tenha conseguido sobreviver durante tantos anos rodando por cima dos insignificantes viadutos.

      A visão da Ponte domingo passado entortaria a cuca de qualquer visitante recém-chegado. À distância,a cena daqueles carros todos escapando pela Ponte dava a impressão de retirantes fugindo e um novo surto de gripe espanhola. O acontecimento transbordou pelas páginas da imprensa internacional e levando a cobiça de várias firmas internacionais que, aproveitando a nova mania, remeteram propostas para a construção de pelo menos 10 pontes ligando a Guanabara aos mais diferentes pontos do país. Algumas firmas,com projetos mais modestos, se propõem ligar a Guanabara à Guanabara mesmo, como uma canadense que sugeriu a construção de uma ponte sobre a Lagoa Rodrigo de Freitas. Mas não são apenas os estrangeiros que querem tirar proveito desse rendoso negócio. O empresariado brasileiro também se mobiliza para investir no ramo.Ricardo Amaral,  dono de uma cadeia de lanchonetes,  mostra-se agora propenso a construir uma cadeia de pontes. E Hubert Castejá, proprietário da Boate Black Horse, está pensando em fechar a casa e abrir uma ponte.

      As madames fazem da Ponte o assunto preferido no cabeleireiro, e as mães dizem aos filhos  que “ se não se comportarem direito não passam na Ponte” e os cidadãos que sempre andam de táxi estão comprando um carro para atravessar a Ponte( que seus construtores não tiveram a menor consideração com os pedestres). Impressionadas com o sucesso da Ponte, várias agências de turismo incluíram-na nos seus roteiros pelo Rio. é possível se ler nos impressos de algumas agências: “Tour pelo Rio com Ponte: Cr$ 120,00; sem Ponte: Cr$ 80,00”.

      Não vai demorar muito, as companhias imobiliárias lançarão a Vivenda d' Netuno, anunciando em seus prospectos sua última oportunidade de morar debaixo da Ponte”; o teatro rebolado aparecerá com uma revista Tem Bububu no Bobobó da Ponte e o dono de um restaurante incluirá em seu cardápio umfilé à vão central.”

      Uma loucura, meus irmãos. Quem ainda não atravessou  a Ponte é olhado com  ar de desprezo. Outro dia, fui arrastado para uma reunião social. Quando perguntaram se eu havia passado pela Ponte e respondi que não, quase me botaram pela porta afora. Fiquei acuado num canto da sala cercado de perguntas: mas você ainda não foi? Precisa ir. E seguiu-se uma infinidade  de adjetivos grandiloqüentes: é monumental, é uma beleza, é jóia, é espetacular, é uma segurança, é formidável. Compararam-na com os Jardins Suspensos da Babilônia, com o Farol de Alexandria, com a Muralha da China e evidentemente não faltou quem dissesse que é a maior do mundo. Quer dizer, agora somos também campeões mundial das pontes.

      Nem mesmo o preço do pedágio, alto, tem desencorajado a moçada. Os construtores acham até que, se cobrassem o mesmo que foi cobrado para o show da Liza Minelli, todos pagariam. Tem gente deixando de comer para atravessar a Ponte. Alguns gastam o equivalente a uma noitada em boate com a nova diversão. Sábado passado, um vizinho nosso pagou  uma conta de CR$ 220,00 de pedágio. Deslumbrado com a grandiosidade da obra, passou horas circulando pr’a  e pr’a , pr’a . Um outro conhecido desembolsou CR$ 180,00 num dia. Mas este não estava muito preocupado com a grandiosidade da obra. Apenas paquerava uma menininha do posto de pedágio. Enquanto, porém, o  contribuinte empobrece, o motorista de táxi fica rico. Estão atravessando a Ponte com bandeira cinco. Cobram até CR$ 100,00 a depender da cara do freguês. Se tiver cara de turista, cobram mais. Para os motoristas, a nova brincadeira transformou-se numa lucrativa fonte de renda. Ou melhor, ponte de renda.

      Do outro lado da Ponte então está Niterói. O que não tem a menor importância. Poderia estar Tribobó, Campos, Salvador e poderia até não estar nada que o carioca seguiria em frente de qualquer maneira. Os cariocas descem do outro lado perguntando pelas boates, bares, restaurantes, boutiques. Assumem um comportamento de turista. Alguns chegam a  enviar postais para os amigos no Rio . Atualmente tem mais carioca em Niterói do que brasileiro em Buenos Aires. No último fim de semana , eles invadiram a cidade como verdadeiras divisões panzer, acabando com toda a comida, estacionamento, bebidas e, principalmente a paciência dos niteroienses.

      Diante desse quadro, o índio Araribóia não deve estar entendendo nada. A terra treme sobre sua cabeça. Fundador da aldeia de São Lourenço, que hoje é Niterói e amanhã ninguém sabe o que vai ser, Araribóia entrou para a história do Brasil pela porta do heroísmo, ajudando Estácio e Mem de Sá no combate e expulsão dos franceses do Rio de Janeiro. Nesses últimos dias, sua figura vem sendo lembrada com muita freqüência pelos niteroienses. Todos eles gostariam de tê-lo vivo para novos combates. Dessa vez, contra os cariocas.

 

 

 
 

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19/11/2005